O povo brasileiro está pobre, doente e nunca chegou a ter acesso às decisões sobre os rumos do país. E não acreditamos que esse povo venha a conhecer justiça e democracia sem o concurso decisivo e organizado das lideranças, militantes, trabalhadores pretos e pretas, intelectuais, articulistas, ativistas, que são as verdadeiras classes produtoras na linha de frente do país. O poder político vigente tem-se revelado num passado recente em conduto impróprio para expressão dos reais interesses das massas exploradas brasileiras. Está na memória do povo preto brasileiro a conduta vacilante de parcelas significativas de seus quadros quando da aprovação pela extinção da Secretaria Nacional de Promoção da Igualdade Racial, da Secretaria Nacional das Mulheres, já mencionadas, e de outras medidas estruturantes de interesse da população negra.
Apegado a uma crítica formalista e juridicista do regime autoritário, o atual governo golpista tem-se revelado impermeável aos temas sociais e políticos que tocam, de fato, nos interesses da população preta brasileira. Amplos setores das elites políticas e intelectuais das camadas médias da população têm afirmado que “não soou à hora” de se dividir a oposição articulada no interior do governo, afirmando que a democracia não foi ainda conquistada. Rechaçamos com veemência tal argumento: Primeiro: porque em momento algum podemos aceitar a subordinação dos interesses políticos e sociais das massas trabalhadoras a uma direção neoliberal conservadora, de extração privilegiada economicamente;. Segundo: porque não podemos aceitar que a frente das oposições se mantenha a custa do silêncio político da população negra e pobre, único e verdadeiro sujeito e agente de uma democracia efetiva. Tampouco consideramos que a existência de partidos políticos populares venha a contribuir para romper uma efetiva frente da luta dos verdadeiros democratas.
Nós, esse coletivo formado por ativistas, lideranças, militantes, intelectuais, articulistas, artistas e simpatizantes da luta negra no Brasil, não pretendemos ser donas e donos da Nova Frente Negra Brasileira, mesmo porque acreditamos sinceramente que existe, entre a numerosa militância capacitada e devotada, quem assuma a tarefa de construir as articulações e lideranças no partido. Estamos apenas procurando usar nossa autoridade moral e política para tentar abrir um caminho próprio para o conjunto das ações que alcancem os direitos negados à população preta para o pleno gozo da democracia. Temos consciência, por outro lado, de que, neste momento, cabe a nós a honra e a responsabilidade de tomar a iniciativa. É somente em vista disso que reivindicamos o papel de levantar a bandeira da Nova Frente Negra Brasileira.
As tentativas de reviver os áureos tempos da Frente Negra Brasileira, ainda que, hoje, sejam anunciadas “sem erros do passado” ou “de baixo para cima”, nos dá uma diretriz importante para o processo de organização da comunidade negra desde os tempos em que as ações da FNB fizeram toda a diferença para centenas de famílias que foram contempladas com as políticas criadas pela sigla. A elite nacional dominante construiu ao longo dos anos, seus próprios partidos políticos. Denunciamos suas tentativas de iludir os trabalhadores pretas e pretos brasileiros com seus rótulos e apelos demagógicos e de querer transformá-los em massa de manobra para seus objetivos.
A Nova Frente Negra Brasileira considera imprescindível que todos os setores sociais e correntes políticas interessadas na luta pela democratização do país e na luta contra o racismo e o domínio do capital monopolista unifique sua ação, estabelecendo frentes interpartidárias e intersetoriais, que objetivem conquistas comuns imediatas e envolvam não somente uma ação meramente parlamentar, mas uma verdadeira atividade política que abranja todos os aspectos da vida nacional. A Nova Frente Negra Brasileira denuncia o modelo econômico vigente, que, tendo transformado o caráter das empresas estatais, construídas pelas lutas populares, utilizam essas empresas e os recursos do Estado, em geral, como molas mestras da acumulação capitalista ocasionando um desequilíbrio social que atinge, de forma substancial, a população negra e pobre das periferias de todo o Brasil. A Nova Frente Negra Brasileira defende a volta das empresas estatais a sua função de atendimento das necessidades populares e o desligamento das empresas estatais do capital monopolista.
A Nova Frente Negra Brasileira entende que a emancipação dos modelos atuais de trabalho é obra dos próprios trabalhadores negros e negras, que sabem que a democracia é participação organizada e consciente e que, como classe explorada, jamais deverá esperar da atuação das elites privilegiadas a solução de seus problemas. A Nova Frente Negra Brasileira entende também que, o governo golpista sendo substituído nas eleições de 2018 por uma democracia formal e parlamentar, fruto de um acordo entre elites dominantes, excluindo a participação organizada do povo (como se deu no golpe de 2016), tal regime nasce débil e descomprometido com a resolução dos problemas que afligem nosso povo e de pronto será derrubado e substituído por novas formas autoritárias de dominação – tão comuns na história brasileira.
Por isso, a Nova Frente Negra Brasileira proclama que a única força capaz de ser fiadora de uma democracia efetivamente estável é a das massas exploradas do campo e das cidades. A Nova Frente Negra Brasileira entende, por outro lado, que sua existência corresponde à ânsia da população preta brasileira por um partido que se construa intimamente ligado ao processo de organização popular, nos locais de trabalho, de moradia e nos espaços de convivência, encontros e sociabilidade. Nesse sentido, a NFNB proclama que sua participação em eleições e suas atividades parlamentares serão fiéis ao seu objetivo maior, que é estimular e aprofundar as organizações das massas exploradas. A Nova Frente Negra Brasileira não surge para dividir o movimento negro, e não desconsidera sua abrangência e a especificidade das diversas frentes de reivindicação, muito ao contrário, a intenção é apresentar à militância, uma expressão política independente na sociedade, a partir do que nos unifica: a luta contra o racismo, a injustiça contra o povo negro e a ampla falta de representatividade da população negra. E é nessa medida que a Nova Frente Negra Brasileira se tornará, inevitavelmente, um instrumento decisivo para a população preta na luta efetiva pela igualdade racial no Brasil.